segunda-feira, 6 de abril de 2009

O Manchester-FC Porto visto pelo eurofosso das receitas

Se os jogos de futebol fossem decididos exclusivamente pela capacidade que os emblemas têm para conquistar receitas nos diversos mercados - bilhetica, publicidade, produtos ou direitos televisivos - o FC Porto estava dispensado de jogar contra o Manchester United. Acontece que o futebol é um desporto. Ainda…

As sociedades anónimas desportivas para o futebol de FC Porto, Benfica e Sporting não apresentam grandes diferenças entre si quando analisamos as estruturas das respectivas receitas operacionais (sem transferências de futebolistas). Os três maiores emblemas portugueses também são gémeos quanto à distância que os separa dos emblemas inseridos em mercados mais pujantes que o nosso, mas com os quais são desafiados a competir época a época, na Liga dos Campeões ou na Taça UEFA, sob pena desse fosso europeu ser ainda mais cavado.

Nos quadros e gráficos que publicamos nesta página é possível observar a dimensão do fosso que separa o FC Porto (54,9 milhões de euros) do adversário que amanhã defrontará nos quartos de final da Liga dos Campeões, o Manchester United, cujas receitas operacionais somam 324,8 milhões de euros, ou seja, cerca de seis vezes as do campeão português. Neste comparativo, nem mesmo o Villareal -- emblema espanhol que a maioria dos adeptos portistas preferia como adversário - anda por perto uma vez que contabiliza mais 14 milhões de euros. Daí para cima, entram em jogo nestes quartos de final da "Champions" equipas de clubes e sociedades que figuram entre as 10 mais ricas do eurofutebol, conforme consta do último relatório da Deloitte, uma das mais conhecidas empresas de consultadoria financeira e de gestão.

Se uma das evidências dos quadros que apresentamos nesta página é a de que, afinal, não há qualquer razão para qualquer dos grandes se poder sentir mais poderoso no terreno da captação de receitas, incluindo o Benfica que tem tido uma política muito afirmativa nesta área e a qual não parece encontrar respaldo na análise comparada com Sporting e FC Porto. Pelo contrário, o que os quadros e gráficos mostram é uma grande estabilidade das receitas dos três grandes e não apenas no que respeita aos direitos televisivos conforme ainda recentemente referiu Domingos Soares Oliveira. Este administrador da Benfica SAD considerou num dos últimos "Prós e Contras" da RTP1 que a receita relativa à venda dos direitos televisivos era a única em que o emblema da águia não conseguia competir com os mais poderosos da Europa, mas a verdade é que a comparação entre outro tipo de receitas como as de bilheteira ou de publicidade e "merchandising" reproduz uma diferença de dimensão similar conforme podemos verificar, por exemplo, pelas verbas inscritas na coluna da área comercial com o Bayern de Munique à cabeça em função dos 176,5 milhões de euros arrecadados na época 2007/08.

De resto, a ideia de que os direitos televisivos do Benfica estariam abaixo, ou mesmo muito abaixo, da popularidade e das audiências que é capaz de conquistar resulta numa equação sem solução quando procuramos analisar essa popularidade através dos clientes activos que são a base de outras receitas como as da venda de bilhetes ou de publicidade e "merchandising": de facto, como deveremos ler (e comparar) as receitas da coluna de bilheteira e "corporate" somadas às da coluna comercial que no caso do Benfica atingiram os 33,2 milhões de euros (em 11 meses da época 2007/08) face aos 36,3 milhões do FC Porto (em 12 meses)?

Uma observação atenta do quadro da evolução das receitas operacionais entre 2002/03 e 2007/08 torna muito clara a estabilidade dos três grandes emblemas do nosso futebol, fortemente influenciada pelas suas carreiras nas eurotaças - atentemos nas receitas do FC Porto quando foi campeão europeu em 2004 ou nas do Benfica em 2006 quando foi eliminado nos quartos de final da Liga dos Campeões pelo Barcelona -- e apenas com pequenas variações resultantes da entrada em funcionamento dos novos estádios construídos para acolher o "Euro 2004". A pequena dimensão do mercado interno português como factor fortemente condicionante do poder financeiro dos nossos maiores emblemas está bem expressa na comparação desse pequeno efeito dos novos estádios do "Euro 2004" com a autêntica explosão de receita de bilheteira no novo estádio do Arsenal (119,5 milhões de euros em 2007/08, logo a seguir ao Manchester United com 128,2 milhões) com reflexo na evolução do total das receitas operacionais deste emblema inglês: de 192 milhões em 2005/06, para 264 em cada uma das duas épocas seguintes. E o mesmo podemos dizer do efeito do novo estádio do Bayern de Munique na evolução das receitas deste embelma alemão.

Se no plano da concorrência directa, ditada, afinal, pela dimensão dos respectivos mercados internos, FC Porto, Benfica e Sporting só podem ombrear com as melhores equipas europeias a partir de engenhosas gestões desportivas, sejam elas baseadas na formação própria ou na valorização do "import-export", também não é menos verdade que o Estado português não tem agido para tentar ajudar estas empresas de ponta de uma indústria que apesar dos passos em falso tem conseguido como poucas outras impor o nome do País e obter ganhos consideráveis para o próprio erário público, traduzidos em milhões e milhões de euros em vendas de jogadores para o estrangeiro.

E não se diga que as políticas das administrações públicas não são influenciadoras da concorrência desportiva na União Europeia: basta recordar que a vizinha Espanha adoptou como medida de protecção à indústria do futebol a aplicação aos futebolistas estrangeiros de uma taxa de IRS reduzida a 25 por cento, enquanto em Portugal, essa taxa permanece nos 42 por cento apesar dos repetidos pedidos de clubes e sociedades desportivas para que a carga fiscal se torne menos pesada.

Fonte: Jornal O JOGO

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